Querido Diário,
As plantas são seres vivos. Não são apenas remédios e propriedades terapêuticas. Ontem mesmo eu estava contando uma história para o meu amigo cigano Miguel... sobre um período que eu passei... quando eu estava olhando para as plantas e vendo-as como "propriedades terapêuticas" e "remédios". Foi um efeitozinho desagradável que me surtiu quando eu me formei em Fitoterapia no início deste ano.
Graças um bom Deus, um companheiro me deu de presente um livro maravilhoso: "A vida secreta das plantas" (de Peter Tompkins e Chirstopher Bird) e então eu pude voltar a sentir as plantas como seres inacreditavelmente vivos e conscientes que são...
Com certeza absoluta não foi culpa dos meus professores, que foram instrutores impecáveis, realmente muito bons, e nos passaram muitos conhecimentos. Eu é que, de tanto ouvir as propriedades curativas dos seres por tantos meses, entrei naquela distorcida sintonia sem querer.
Na época, pedi à minha amiga Cris que me trouxesse, de Niterói, uma beldroega. Era um excelente antibiótico (deixa o Professor Enilson ler isso!!) e, por isso, eu queria reproduzir algumas aqui em casa com o intuito de produzir fitoterápicos.
"Me traz uma beldroega, Cris?"
"Levo, sim."
"Eu quero fazer uma garrafada de um litro de beldroega! Vai ser uma maravilha!" vibrei.
"Você sabe, Atma... que eu estive me conectando com os seres vegetais," disse Cris, com sua incrível sensibilidade e conexão com os seres. "Eu senti que não é preciso macerar as plantas. Basta estar próximo às plantas, olhar para elas, conectar-se com elas, que elas doam a energia delas para nós..."
Ah, mas aquelas garrafinhas âmbar eram tão bonitinhas! Eu queria muito brincar de fazer várias, várias delas! Uma mais bonitinha que a outra! Colocar as etiquetas com data, nome da planta, propriedades curativas, data de validade. Tudo catalogado bonitinho. Era como brincar de vidrinhos! Só que eram vidrinhos de cura! Terapêuticos!
"Eu sei, Cris. Claro, acredito nisso, sim," respondi, e fui logo falando, "E então? Me consegue uma muda de beldroega?"
A Cris ia falar mais alguma coisa mas, hesitou, e limitou-se a me responder, "Levo, sim."
Que adiantaria ela me falar alguma coisa naquele momento, em que eu estava dura como uma pedra?
Alguns dias depois, a Cris me trazia a beldroega, embrulhada em um saco de jornal.
"Valeu, Cris!" agradeci, e tirei-a do saco, arranjei um copo de água e coloquei um pedaço da beldroega ali, para que dali crescesse uma raiz e, então, eu poderia plantá-la em um vaso.
O restante do que a Cris me trouxe eu tratei de fazer a minha primeira garrafada de beldroega. Eu queria ter um potente antibiótico em casa! Já até podia imaginar alguém ficando com a garganta seriamente inflamada, e lá viria eu, com a minha poção mágica, para curar milagrosamente aquela pessoa. Meu ego se inflaria e eu diria, cheia de satisfação,
"Eu não disse que tudo o que é natural tem mais força? Eu não disse?! Não disse que as plantas têm muito mais poder do que os alopáticos?! Pois bem! Veja que maravilha o poder desta beldroega!" E daria um sorriso triunfante, que me faria parecer ilusoriamente a mais cândida e sabida das criaturas.
Quando o ex-doente viesse me agradecer pela cura, eu assumiria uma postura da mais falsa humildade e responderia, "Que isso... que isso... Eu não fiz nada... Foi a beldroega. Foi o poder da natureza!"
Enquanto, na verdade, eu só queria guerrear contra a medicina alopática. Queria ter razão quanto a isso. Mostrar a nossa superioridade.
Mas eu estava tendo o mesmo comportamento alopático, obsessivo e distorcido dos alopatas, embora não percebesse...
Foi quando então eu tive a bênção de ficar com a garganta inflamada, por causa de alguma chateação que, na hora, não consegui processar bem. Algo que queria falar e não falei... Algo que tive que "engolir". Ego, ego, ego...
Foi este o modo que a Sabedoria Divina arranjou para me recolocar de volta em sintonia com a beleza das plantas, com a simplicidade verdadeira das coisas da natureza...
Eis que, nesta semana, com o desconforto da garganta inflamada, eu mergulhei na leitura do livro "A vida secreta das plantas" que havia ganhado de presente. Redescobri os seres sencientes que elas são... e a doce conexão que elas têm para conosco, seres humanos...
Envergonhei-me de minha atitude com o pedaço de beldroega que estava dentro de um copo d´água na janela da cozinha, esperando "fazer raiz" para que eu pudesse "plantá-la em um vaso". Parecia até que eu tinha virado criadora de porcos! É, esse pessoal que cria bichos para depois matá-los! Eu estava fazendo a mesma coisa, só que no Reino Vegetal.
Fui até a cozinha, peguei o copo d´água, trouxe aquele pedaço de pequeno ser para perto de mim e, com os olhos fechados e o coração cheio de carinho, pedi,
"Me perdoe, pequeno serzinho da natureza. Assim como eu, você também tem o direito de viver, existir, usufruir, respirar, crescer, morrer... Me perdoe ter te tratado como uma coisa. Você não é uma coisa. Você é uma planta muito bonita e verde! Não me importam mais as suas propriedades curativas! Eu sei que você as tem, mas o que mais me importa é que você é um ser vivo... assim como as borboletas, os beija-flores, os sabiás, assim como todos os seres de todos os reinos!"
Engoli a saliva, e senti a minha garganta reclamando.
"Querida beldroega, eu vou me lembrar do que a Cris me ensinou e não vou pedir um pedaço de você para comer. Eu quero pedir que você doe um pouco da sua energia amorosa para mim, para que a minha garganta fique boa. Você gostaria de fazer essa troca energética comigo?" pedi, respeitosa e amorosamente.
Nesse instante, eu coloquei a minha mão perto da planta, como se fosse uma conchinha, para que ela pudesse despejar ali o seu perdão e o seu afeto por mim. Foi então que uma delicada folhinha da beldroega caiu na palma da minha mão...
Abri os olhos e vi que o galho de beldroega estava um pouco mais ereto dentro do copo, com as outras folhas ainda firmes, mas... na palma da minha mão, a pequena folha...
Sorri para a beldroega e ela sorriu para mim... Esta foi uma das conexões mais lindas que tive com o Reino Vegetal... Aquele ser estava me doando uma de suas folhas, para que eu pudesse mastigar, e ficar com a garganta boa.
Eu entendi o que ela "disse" e, cuidadosamente, coloquei aquela folha em minha boca e comecei a mastigar, vagarosamente, sentindo cada partícula daquele ser integrando-se a mim.
"Agora você está em mim..." vibrei, em suave sintonia.
"Agora eu estou em você... o meu coração está com você e o seu está comigo..." vibrou o Ser Verde...
A nossa conexão continuou... beijei-a suavemente para não deixar cair mais nenhuma folha, e coloquei-a de novo no lugar, prometendo que iria, no dia seguinte, comprar um vaso com terra para plantá-la bem bonita, e prometi que não iria picá-la toda para fazer "remédio" quando ela estivesse grande.
A planta ficou aliviada e agradecida e, naquela noite, ela morreu, tranquila, porque uma parte dela já estava dentro de mim... neste pequeno universo que eu sou... e, tão pequena que ela era, mas uma parte de mim também está com ela, naquele pequeno universo que ela é.
Ah, Diário... quantas facetas tem o Amor...
Amor,
Atma.