Um inesquecível nobre Samurai

Diário,

Eu fico boba como pode uma pessoa doce e maravilhosa como eu possuir também o poder da raiva dentro de mim. Controle emocional completo? Quisera eu já ter atingido! Não. Estou longe disso. Ih, bota longe nisso! E olha que eu já estou na Escola de Mistérios há mais de cinco mil anos, hein?

Há uns dois anos, eu me vi, no antigo Egito... Eu estava toda vestida de branco... com uma fita dourada que transpassava a minha cintura. À minha frente, havia um homem. Um ancião. Ele era da alta hierarquia. Ele estava doente, e eu possuía o poder de curá-lo com um mudrá poderoso de minhas mãos. Ah, eu era toda amor e candura! De minhas mãos, raios multicoloridos saíam, espargindo ondas de cura milagrosa, de tal sorte que o homem rapidamente se estabelecia. E o vento do Egito soprou em meus ouvidos, “Você cura por amor... Você era uma estudante dedicada dos mistérios... E continuou a fazê-lo por toda a vida... Você... Que era toda amor e brandura...” Eu parecia um anjo de verdade!

Eu acordei naquele dia me sentindo muito bem. Levantei, fui até o banheiro lavar o meu rosto. Me olhei bem, girando o rosto ora para a esquerda ora para a direita, envezando os olhos, e perguntei para mim mesma, “Você? Toda amor e brandura? Será que aquela ventania estava falando com a pessoa certa?” (Que pecado! Eu duvidando de mim mesma!)

Lavei o rosto, para ver se de repente por debaixo de todo aquele mau humor que eu andava vivendo existia aquela criatura tão branda, mas não encontrei nada.

Tomei café, e saí para caminhar. Meu celular tocou. Era uma amiga, dizendo que havia torcido o pé e pedindo para eu ir até a casa dela aplicar um Reiki. Assim eu fui. Quando eu voltava para casa, um outro telefonema. Outro amigo. Dizendo que sentia-se triste, e pedindo para eu enviar um Reiki à distância. Com prazer, fiz o que ele pediu. Em casa, o e-mail de um desconhecido, que de algum modo conseguiu o meu endereço eletrônico, e me pedia algumas palavras de conforto para um caso difícil que ele passava. Orei ao Universo pedindo inspiração e uma enxurrada de belas palavras nasceu de mim e enviei para ele... E assim seguiu o meu dia, me fazendo perceber que existia uma grande dose de bondade em mim, deste desejo genuíno que em mim brota, de querer ajudar, de querer contribuir, de compartilhar. Fraterna! Acho que é o que melhor me descreve nestes momentos. Sim, esta também é uma qualidade bem desenvolvida em mim.

Porém, ainda vivo na dualidade. Ainda trago, em contrapartida, o instinto da guerreira. Esta noite mesmo sonhei que eu estava em um local onde havia vários lutadores. Eu era uma lutadora e, como a minha fama era grande neste local, um outro lutador veio me desafiar para uma luta. Eu estava encostada em uma sacada, os braços cruzados na altura do peito, as pernas musculosas posicionadas lado a lado, firmes. Nem por um segundo eu hesitei ao convite. Segui aquele que me desafiara até uma arena. Os demais nos seguiram, posicionando-se ao redor do círculo para assistir a luta.

Foi com grande desempenho que lutei até que o fiz desistir e se entregar. Eu o agarrei pelo braço esquerdo, e dei um salto inesperado até o alto de um muro, de modo que fiquei pendurada no concreto, perfeitamente equilibrada onde estava, mas deixando-o dependurado, sendo agarrado por mim pelo braço. Ele já não tinha mais como se defender, eu sabia. Era um movimento que ele não esperava, peguei-o de surpresa! Com meu porte feminino porém extremamente forte e hábil, comecei a forçá-lo contra a parede. O corpo dele batia-se contra o concreto com força incrível, espalhando pequenos pedaços de poeira para todos os lados.

Eu olhava para ele com calma, deixando-o perceber que eu estava pronta para continuar naquela posição o tempo que eu precisasse. Eu já era vitoriosa.

Na terceira pancada, vi que ele não ia aguentar muito mais tempo. Internamente, eu rezava que ele pedisse para eu parar. Ele estava começando a se machucar seriamente. E eu não queria vê-lo machucado. Mas eu era ali uma guerreira e, se ele não pedisse, eu não iria parar!

Na quarta pancada ele não suportou mais e bateu com a mão direita no muro repetidas vezes, em um gesto de desistência. Eu fiquei aliviada quando ele jogou a toalha, porque eu não queria machucá-lo. Mas eu era uma guerreira e aquele era o meu dharma. Porém este sentimento eu não transpareci e apenas fiquei de pé com as mãos na cintura olhando para ele, altiva. A mensagem que o meu corpo passava era, “Alguém mais ousa me desafiar?” Meus longos cabelos macios e castanhos pendiam sobre as minhas costas, presos em um rabo-de-cavalo que caía até a cintura.

Quando então a atitude daquele guerreiro me surpreendeu... e me fez reconhecer a imensa grandeza que residia dentro dele: ele ficou de pé novamente na arena e me ofereceu alguns aplausos, batendo bem de leve uma mão na outra, na minha direção. Franzi muito de leve as sobrancelhas e olhei bem no fundo dos olhos dele... Abri o meu centro de energia do coração e sondei aquele espírito... Abri a minha terceira visão e escaneei todas as intenções que nele residiam. Não... Não eram aplausos de deboche! Não eram palmas nem de ironia, nem de sarcasmo...! Eram aplausos sinceros, Aplausos de um samurai que viera me convidar para um duelo e, tendo perdido a luta, não se sentiu nem um pouco ofendido nem diminuído. Ele tivera o prazer de lutar, de batalhar. Era isso o que ele queria! Ter aquela experiência comigo! Não necessariamente me vencer...

Sinceramente, não era o que eu estava pensando enquanto me dirigia para a arena decidida a vencê-lo.

Eu estou até agora (são 10:44h da manhã) analisando minuciosamente a atitude daquele que já não consigo mais chamar de adversário... mas sim de... (Nossa! Difícil achar um bom termo que o defina!) Bem, talvez um bom termo para descrevê-lo fosse... um lutador à minha altura! Mais que isso... Talvez ela tenha sido o único que realmente tenha me superado...

Porque em momento algum ele se deixou levar pela raiva, nem pelo ódio, nem pela vaidade. Só depois eu pude perceber. Só depois... Com aqueles aplausos... Depois eu vi.... que ele se manteve o tempo todo concentrado na precisão dos golpes, na harmonia da luta. Ele manteve o mais perfeito controle emocional... Mesmo na hora de pedir o arrego... Nenhum perturbação o acometeu... Realmente incrível...

Ah, que duelo inesquecível! Em que aquelas palmas não serviram para exaltar o meu ego. Muito pelo contrário! Serviram para despertar, de um só golpe, em mim algo que eu precisava hoje rememorar: o verdadeiro controle emocional... a verdadeira humildade... o verdadeiro sentido das “batalhas” humanas... a verdadeira honra de um samurai.

As batalhas humanas acontecem dentro do nosso coração... Céu e inferno... Onde eles ficam? Na nossa própria mente. Ora somos Deuses. Ora, Demônios. Liberdade. Ego. Lutar... com qual objetivo?

É preciso que o homem esteja bem consciente de que existe um mecanismo insconsciente e coletivo ao qual a mente de todos nós está conectada, e que gera respostas automáticas para as mais diversas situações. E, cada vez que nós nos conectamos com uma determinada “reação nervosa”, mais facilmente nós iremos acessar novamente aquela “reação” de um modo ainda mais fácil e intenso. Então, por exemplo, se eu alimento a minha “reação” de me irritar com as situações, cada vez será mais fácil que eu me irrite, atingindo níveis cada vez mais intensos da onda vibracional da irritação. Se, por outro lado, eu cultivo o controle do meu espírito (tal como o lutador à minha altura), será também cada vez mais fácil, com o passar do tempo, atingir esse domínio das emoções.

Hoje eu acabei de desvendar mais uma dimensão onde existo, e sou conhecida como aquela que é quase impossível de derrotar. Aquela que sangra, mas continua de pé! E que caminha altiva por dentre mulheres e homens e conquistou o respeito de todos. Uma Samurai! Entretanto, de volta cá em Terra, eu me questiono: que tipo de guerreira eu sou? Quem são os meus verdadeiros adversários? Quais as minhas razões para lutar? Que tipo de domínio eu possuo sobre as minhas emoções? A que tipo de reações automáticas eu me permito conectar ao longo do meu dia?

É, Diário... Ainda há muito chão para caminhar... Muito chão para caminhar... Porém, a partir de hoje, levarei sempre comigo a imagem iluminada daquele sábio com quem tive a honra de duelar... e de quem aprendi a verdadeira arte do espírito imortal de um Samurai.